sábado, 8 de agosto de 2009

Basquiat e os limites da arte mercadológica

Quais os limites da arte? Será que para podermos apreciá-la devemos ser totalmente iniciados, ou a arte é de livre interpretação para todos os públicos? Questões como essas não possuem simples e objetivas respostas. Ao assistir o filme Basquiat, 1998, vemos que o diretor questiona temas como esses, mostrando a vida e obra do talentoso Jean Michel Basquiat, muito bem interpretado por Jeffrey Wright.

Basquiat, jovem negro apreciador da arte, começou a praticá-la nas ruas anarquicamente, pichando muros com frases abstratas e idealistas. O filme de Julian Schnabel narra a biografia do pintor, mostrando os caminhos que destinaram ao histórico encontro com Andy Warhol (na pele do andrógino David Bowie) e revelando as drásticas reviravoltas que a arte suscitou em sua vida.

Analisando o filme, vemos que o cineasta mostra bem o ‘quem foi Basquiat’, porém o longa-metragem apresenta, ao mesmo tempo, pontos altos e baixos.

Altos porque explicita aos espectadores como a arte, no caso a pintura, é individual, qualquer ser pode apreciá-la, não é uma arte elitista onde apenas a sociedade de classe mais elevada e erudita pode contemplar. Basquiat veio das ruas e tem o maior gosto por telas.

Baixos porque o filme de certo ponto desmoraliza o personagem. Um bom exemplo para ilustrar tal fato seria o momento de seu auge: René, um rapaz que ficara admirado com a intensidade da obra de Basquiat, foi quem iniciou sua carreira. No decorrer do filme, o artista vai se tornando cada vez mais famoso e, com o surgimento de propostas mais ‘atraentes’ (entenda, que rendam mais dinheiro), vai começando a ignorar René. Além do mais, as elocubrações artísticas, inspiradas por doses exageradas de heroína, passam ao espectador uma impressão de que sua habilidade se residia nos seus momentâneos acessos de loucura; o que não é verdade, pois antes dele conhecer de perto o alto preço dos 15 minutos de fama que Warhol precaveu, Basquiat já era dotado de uma originalidade única.

Basquiat era um negro discriminado que, inicialmente, usava as ruas como tela de suas obras de arte. Ao começar uma carreira de pintor famoso, foi deixando de lado tal origem, passando a não mais fazer arte por gosto, mas sim em busca do dinheiro. A grande preocupação do diretor ao narrar a história de Jean Michel Basquiat foi dar ênfase de como ele sentia a obra e quais os meios que ele utilizava para mostrar (que era o incessante vício nas drogas) o que sentia em suas telas. Através do exagerado consumo de cocaína e heroína, o pintor chegava ao seu ápice para compor seus trabalhos. Na visão do diretor, o protagonista só possuía tal dom devido suas intermináveis doses, as quais acabaram o arruinando, o que acaba causando interpretações equivocadas da obra do biografado.

Noutra visão, o longa mostra o lado bom e o lado mau dos alucinógenos, como se o positivo fosse sua ascensão e o negativo sua queda, como se as drogas ditassem os rumos de sua vida artística. Isso pode servir como exemplo de destruição de imagem do jovem porque o filme passa a percepção de um artista que só abstraía graças ao seu contato com as drogas, que acabaram tendo uma vanglorização.

O filme mostra-nos também como a arte é desvalorizada graças a sua periodicidade. Basquiat chegou a ser muito rico, teve grande sucesso em suas obras. Entretanto, após curto período suas pinturas começaram a serem deixadas de lado pelos seus antigos apreciadores. Esse é o prejuízo que a mercadoria traz à arte: ela usa os artistas como objeto de mercadoria para lucro dos grandes empresários, resultando numa arte publicitária. O filme passa bem a mensagem de dependência ao mostrar uma cena do aclamado pintor Andy Warhol com Bruno. Warhol pede dinheiro para comprar a pequena obra de Basquiat, a qual o empresário achara chula. Óbvio que, depois que Basquiat torna-se um artista mundialmente famoso, Bruno começa a elogiá-los aos montes, implorando por receber um quadro do artista.

Em busca de novos talentos, de públicos diferentes e maiores, os responsáveis pela periodicidade das obras sempre almejam mais e mais fúteis ‘consumidores da arte’, ocultando os artistas que eles avaliam ‘pouco relevantes’ por não atraírem investidores e público.

Resumidamente, a arte está enlatada para quem quiser apreciar. É como se houvesse uma necessidade de traduzi-la ao público para que ele entenda de forma objetiva os preceitos artísticos, reduzindo a obra a um mero ocaso, restrita de diferentes interpretações.

O espectador só pode vislumbrar o que ‘está na moda’. Mesmo porque sua ‘aura’ (como já defendia Benjamin em seu ensaio “A obra de arte em sua reprodutibilidade técnica”) será afetada pelo ‘marketing’ da obra. Por exemplo: Um rico apreciador da arte erudita pode ver uma tela e se encantar com ela. Porém, ao ver que ela não tem seu merecido valor pelo ‘mercado cultural’, achará que tal obra não é tão instigante e envolvente como outrora imaginava, reconsiderando seu conceito e menosprezando sua ‘aura’. De certa forma, sua opinião foi formada pelos ‘mercadores’.

Apesar desses contrastes, o filme levanta uma boa questão: a dos artistas e o que ele quer passar em sua pintura. Basquiat tinha uma visão particular e expressava isso artisticamente; não se apoiava em ninguém para expandir seu imaginário, apesar de aprofundá-lo na loucura da química.

Reforçando as teses de Theodor Adorno e Walter Benjamin, a arte, quando afetada, sofre suas prejudiciais conseqüências. Concluindo a obra Basquiat: Traços de Uma Vida, a abstração é incompleta quando mescla-se com a ambição, que acaba se tornando uma necessidade do homem para obter o lucro dos trabalhos artísticos. Essa recompensa das obras acaba com a aura, possibilitando aos magnatas julgarem o valor de cada uma delas. E é aí que o filme de Schnabel prova sua importância: prova que mesmo um artista talentoso por natureza está passível às agruras do capitalismo.

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4 Atemporalizados:

Ricardo Soares disse...

nem vou entrar no mérito desse lance do Baskiat pra não polemizar! vim aqui te deixar um recado sobre seu comentário about Tasso no meu blog...bem lembrado Tiago! a arrogância do coroné galeguim encalacrada até a médula. Eu posso, eu tenho, eu quero! e tem gente, muita gente, que ainda acredita que ele modernizou o Ceará. Balela!
grande abraço

Tiago Ferreira da Silva disse...

Ricardo,

A polêmica, quando bem abalizada, atrai o debate para que outros também exponham suas opiniões devidas. Contanto que não ultrapasse os limites da tolerância, não deixa de ser um argumento.

Quanto ao Tasso, não passa de um aristocrata moderno que não perdeu sua arrogância arcaica.

Um abraço!

Anônimo disse...

oie,desculpa eu tava sem net, e ando meio sem inspiração.
té mais.

Tiago Ferreira da Silva disse...

Té mais, Mellany!

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